sábado, 28 de fevereiro de 2004

Lembra-te

Lembra-te
que todos os momentos
que nos coroaram
todas as estradas
radiosas que abrimos
irão achando sem fim
seu ansioso lugar
seu botão de florir
o horizonte
e que dessa procura
extenuante e precisa
não teremos sinal
senão o de saber
que irá por onde fomos
um para o outro
vividos

(Mário Cesariny)


sexta-feira, 20 de fevereiro de 2004

Ecologia - pensamento …?

Tendo simultaneamente criado e destruído, nos três posts anteriores, pontes entre a ecologia e algumas correntes ideológicas predominantes (faltaria analisar o marxismo, o liberalismo, o feminismo, o anarquismo e tantas outras), creio que a associação ideológia ao pensamento ecológico não é tão imediata quanto o Observador quer fazer crer e não é, em minha opinião, um exercício que acrescente valor a qualquer das partes do binómio. Apesar disso, devo confessar que a discussão académica do tema é extremamente tentadora e por isso não lhe resisti.
Aos maçados leitores apresento o meu pedido de desculpa e informo que os posts “normais” seguem dentro de momentos.

Ecologia - pensamento socialista?

Apesar da identificação clara de um adversário comum – a empresa capitalista transnacional – subsiste um materialismo subjacente nas abordagens de esquerda que coloca dificuldades substanciais à integração perfeita do pensamento ecológico e socialista.
A democracia social (pensamento socialista ocidental) visa o desenvolvimento do progresso humano na dupla dimensão material e moral.
O progresso material é assegurado pela manutanção do crescimento económico, sendo o progresso moral obtido por via do encorajamento de deveres e obrigações dentro da ordem social.
Neste âmbito, as desiguladades resultantes da busca de interesses pessoais só são permissíveis se beneficiarem os indíviduos que se encontram na base da hierarquia social, i. e., só através do crescimento é que a pobreza, a miséria e a exclusão social podem ser combatidos.
Esta atitude instrumental em relação às coisas naturais deixou muito pouco espaço para as preocupações ambientais.
Porém, o socialismo ético, retomado após o colapso dos modelos de planeamento estatal do leste europeu, focaliza-se na qualidade de vida de todos os membros da sociedade e atribui o ónus da responsabilidade moral aos Estados, organizações, empresas e indivíduos para fazerem as “escolhas certas” em relação às estratégias de investimento, aos contratos comerciais e ao consumo pessoal, numa clara evolução ideológica que começa a permitir a aproximação ao pensamento ecológico.
Ann Taylor em “Choosing Our Future” conclui que só o socialismo possui a perspectiva internacionalista apropriada para superar as diferenças nacionais e regionais que tendem a bloquear as iniciativas ambientais de largo espectro. O socialismo alargaria a dimensão de comunidade ao ponto de permitir superar as desigualdades globais e resolver problemas comuns.
A ética socialista reconhece a centralização humana como ponto de partida, mas mantém a lembrança permanente da necessidade de prevenir as imperfeições da ainda vigente visão tecnocrática da transformação socialista.
É todavia inquestionável a preocupação socialista pela justiça social aliada à necessidade de um ambiente saudável e seguro onde todos os membros da sociedade possam prosperar.

Ecologia - pensamento neoliberal?

Os liberais críticos contemporâneos, i. e., os defensores do neoliberalismo, celebram a operação dos sistemas de mercado capitalistas onde os indivíduos, os agregados familiares e as empresas empreendem uma competitividade e uma cooperação, de forma a assegurarem os benefícios do progresso material.
Este crescimento coloca dificuldades significativas - e em última análise intransponíveis - em termos da capacidade do ecossistema fornecer recursos naturais suficientes para satisfazer as necessidades humanas. É impossível o crescimento ilimitado baseado na exploração dos recursos limitados de um planeta.
O liberalismo e as suas atitudes em relação ao ambiente (e. g. comércio de licenças de poluição), baseadas nas concepções lockeanas da propriedade privada, apesar de pontualmente estabelecerem limites efectivos à delapidação de recursos, encerram um antropocentrismo subjacente, que é difícil de conciliar com as coisas não humanas numa perspectiva holística.

Ecologia - pensamento conservador?

No pensamento conservador, situado à direita do espectro político, surgiu uma alternativa ao domínio das abordagens neoliberais e socialistas relativamente ao ambiente.
O pensamento conservador refuta a tendência para associar o pensamento e a política ecológicos aos movimentos socialistas, preferindo considerar o ponto de vista conservador da Natureza como uma visão forte da forma de se viver em harmonia com o mundo natural. Os conservadores combinam, de forma intuitiva, um respeito pela Natureza com a convicção nas virtudes da propriedade privada.
Ao contrário do pensamento neoliberal, que considera as coisas naturais como simplesmente exploráveis, os conservadores encontram nas coisas naturais parte de uma rede de vida complexa, da qual os seres humanos são apenas uma parcela significativa.
John Gray no seu “Programa para o Conservantismo Ecológico” censura os pensadores de direita por deixarem resignadamente as questões políticas relacionadas com a ecologia nas mãos solícitas da esquerda. E vai mais longe, afirmando que as virtudes e as convicções conservadoras tradicionais se identificam de uma forma muito mais intensa com a teoria ecológica do que as políticas socialistas. O pensamento ecológico parece perder demasiado tempo a criticar os mercados capitalistas e a fechar os olhos às consequências do planeamento estatal.
Outro ponto de comunhão fundamental prende-se com o facto de, quer o pensamento conservador, quer o ecológico, realçarem de forma inequívoca a importância de uma perspectiva multigeracional, em vez do contrato de uma geração.
De igual forma, ambos tentam destruir a relação entre a crença num crescimento infinito e as condições para a prosperidade humana. Ambos acreditam que chegaremos irremediavelmente ao ponto de sermos obrigados a pensar imaginativamente com aquilo que temos.
O pensamento conservador consegue, de uma forma que não está ao alcance de nenhuma outra ideologia política, estar claramente consciente da importância do reconhecimento da complexidade, do risco e da incerteza, que constituem factores incontornáveis para a percepção da problemática ecológica.

"O poema não é feito dessas letras que eu espeto como pregos, mas do branco que fica no papel."
(Paul Claudel)

A Nova Esquerda

Li aqui algumas considerações sobre o que será a Nova Esquerda. Apeteceu-me, desde a primeira linha (aliás, desde o título do post), dar réplica ao esforçado mas pouco sucedido escriba. Admito que por falta de tempo e excesso de argumentos limito-me a linká-lo. Contudo, tomo nota imediata do seguinte excerto, que vai merecer em tempo oportuno uma réplica no HHT.

"De igual forma se explica porque a grande maioria dos movimentos "Verdes" são de esquerda. Na verdade, estes movimentos ditos ecológicos, não se preocupam o suficiente com o meio ambiente. Pretendem apenas um ambiente à sua maneira, com as prioridades pré-definidas e não determinadas pelo indivíduo. Qualquer pessoa consegue provar que um meio ambiente saudável é essencial ao bem estar e desenvolvimento económico. Da mesma forma, qualquer economista consegue demonstrar como tiramos proveito de uma política ecológica capaz. Não é preciso ser de esquerda para defender a floresta e acreditar na limpeza dos rios e dos mares."

De facto, a maioria dos movimentos ecologistas está situada à esquerda, mas os motivos não são os apontados pelo Observador. Na realidade, o seu lugar natural poderá ser, como futuramente tentarei explicar, à direita ou à esquerda, sem que isso represente qualquer contradição ideológica.

segunda-feira, 16 de fevereiro de 2004

Urbaneye Project

Nestes tempos orwellianos é imprescindível dar uma espreitadela ao que se vai fazendo no âmbito do Urbaneye Project.
Este projecto de investigação comparativa analisa a utilização de CCTV (circuitos fechados de televisão) em espaços públicos na Europa e tem por objectivo avaliar os seus efeitos sociais e políticos por forma a delinear estratégias para a sua regulação.
A equipa de trabalho é constituída por elementos de 7 países e inclui criminologistas, filósofos, cientistas políticos, sociólogos e geógrafos urbanos.

domingo, 8 de fevereiro de 2004

Rembrandt van Rijn – “The syndics of the drapers’ guild”

Nesta pintura famosíssima e absolutamente notável, Rembrandt junta as seis personagens (os cinco síndicos e o assistente) em redor de uma mesa, com o objectivo de contornar a formalidade típica nestes retratos.
O extraordinário pormenor de génio encontra-se, porém, no segundo síndico a contar da esquerda, prestes a levantar-se, evitando assim a indesejável representação dos cinco chapéus em linha!
Uma vez que a pintura se destinava a ser pendurada numa parede a grande altura, Rembrandt adaptou a perspectiva para esse fim, sendo notório que estamos a olhar para a mesa a partir de um plano inferior.




Anton Mauve – “Morning ride along the beach”

Cavaleiros passeiam calmamente pela praia de Scheveningen, a estância balnear situada às portas de Haia. Mauve recria na perfeição a atmosfera de um dia de Verão, com as sombras curtas, a areia solta, o calor e os espaços abertos.
Os sulcos de rodas conduzem a nossa vista até aos cavaleiros e, de seguida, até às figuras minúsculas perto do mar.
Pormenor curioso: um dos antigos proprietários desta pintura “apagou” os excrementos de cavalo na areia, por considerar que estes não eram apropriados. Aquando do restauro do quadro, os excrementos reapareceram.




quinta-feira, 5 de fevereiro de 2004

Rembrandt van Rijn- "The Nightwatch"

Continuo a "postar" as minhas obras de eleição no Rijksmuseum.
A tela da "Ronda da Noite" tem a particularidade de ter sido mutilada no séc. XVIII, por forma a caber numa parede de um edifício público. Este acto tresloucado levou ao "desaparecimento" de três personagens no lado esquerdo da tela...
A versão integral da tela é conhecida através de uma providencial réplica em miniatura, realizada antes da mutilação e que, apesar da fraca qualidade, tem hoje o privilégio de partilhar com a tela original uma das paredes do Rijksmuseum.




segunda-feira, 2 de fevereiro de 2004

Johannes Vermeer - "The kitchen maid"

Há neste quadro pormenores que, infelizmente, a blogosfera não permite partilhar. Mas aqui fica o lembrete para uma próxima viagem a Amsterdam. Minha ou vossa.



Ainda há paciência?!