As inqualificáveis agressões a que foi submetido um deputado da República não podem ser ignoradas nas suas causas mais profundas, sob pena de, num futuro próximo, se virem a repetir.
Em Felgueiras foram expostas à evidência as graves debilidades de que ainda enferma a nossa cultura democrática.
A “sociedade da informação”, erroneamente percepcionada pela classe política como generalizada no Portugal hodierno, apresenta ainda vastas zonas de exclusão de que a enraivecida mole humana felgueirense é um exemplo. O “país a duas velocidades” é uma realidade e tentar escondê-la terá consequências ainda mais gravosas do que combatê-la.
A classe política não pode ignorar este dramático alerta para o défice cultural que ainda grassa em algumas zonas do país (e não apenas no interior!). As políticas e os instrumentos de que dispõe neste domínio (formação e informação) deverão ser monitorizados na sua eficácia e eficiência e, se necessário, reformulados sem demora.
Se a apropriação errónea de conceitos relativos aos direitos, liberdades e garantias do regime democrático é imputável a alguma iliteracia das populações, não é menos verdade que a classe política tem também responsabilidades às quais não se pode eximir e que são exclusivamente suas. A defesa reiterada de posições corporativistas - não poucas vezes ao arrepio dos padrões morais, éticos e deontológicos que deveriam pautar a sua actividade - conduziu ao progressivo descrédito da classe e constitui uma causa próxima para os selváticos ataques ao deputado Francisco Assis.
Estão também agora à vista os efeitos de certa política, eivada de demagogia, de populismo desbragado e de apelos sistemáticos aos sentimentos mais elementares das populações.
Este caldo de cultura potencia a alienação das massas e tem, por isso, consequências imprevisíveis.
O país profundo existe e, entre manifestações de indignação e discursos de boas intenções, continua a afundar-se inexoravelmente perante o atavismo geral.
O vilipêndio das instituições democráticas, já severamente fragilizadas por outros escândalos, não pode ficar impune.
O regime democrático está ameaçado e já levou as primeiras estaladas. Continuará a representar o papel do pai demissionário por muito mais tempo?
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